sexta-feira, 1 de setembro de 2017

Sepse

INTRODUÇÃO

A sepse - Síndrome de resposta inflamatória sistêmica (SRIS) desencadeada por infecção - é uma das mais importantes complicações infecciosas da medicina contemporânea, tanto por sua incidência quanto por sua gravidade e pelo grande potencial para o óbito.
Na era pré-antibiótica, as bactérias Gram-positivas, como Streptococcus pyogenes e Staphylococcus aureus, eram as grandes causadoras de sepse. Com o advento da penicilina e seus derivados, as bactérias Gram-negativas, como as Enterobacteriaceae (Escherichia coli, Klebsiella pneumoniae, etc) e Pseudomonas aeruginosa, tornaram-se os principais agentes causadores de sepse por muitos anos. Atualmente, com a disponibilidade de novas técnicas invasivas de terapia intensiva, as bactérias Gram-positivas, como os estafilococos coagulase-negativos e o próprio Staphylococcus aureus, voltaram a ter grande importância na etiologia. Os fungos, representados principalmente pelo gênero Candida, são hoje importantes causadores da doença séptica.
A fisiopatologia da sepse está intimamente ligada à interação das células do hospedeiro com os componentes bacterianos presentes na corrente sanguínea, como o lipopolissacarídeo (LPS) das bactérias Gram-negativas. Esta endotoxina, o LPS, contém uma porção tóxica denominada lipídeo A, comum a todos os germes Gram-negativos.
A cultura de sangue (hemocultura) é um dos procedimentos mais importantes realizados no laboratório de microbiologia. O sucesso deste teste está diretamente relacionado com os métodos utilizados para coletar a amostra de sangue. A maioria das amostras de sangue é inoculada diretamente em frascos de cultura contendo meio de enriquecimento. Para garantir a máxima recuperação de microrganismos importantes, o inóculo deve ser realizado em duplicada.
O pesquisador relata o caso de uma paciente com quadro de sepse de foco urinário.

RELATO DE CASO


J.F.N.R., sexo feminino, 32 anos de idade, deu entrada em uma instituição de saúde localizada no município de Coronel Fabriciano-MG, com quadro de dor lombar no flanco esquerdo, hipotensão, mal-estar geral e tontura. No acolhimento de enfermagem a paciente relata que apresenta estes sintomas a 2 dias, a mesma relata que já teve um quadro de cálculo renal (nefrolitíase) tratado na mesma instituição. A mesma nega outras comorbidades, nega alergia medicamentosa ou uso de medicações controladas. Ao exame clínico da enfermagem a paciente apresentou os seguintes dados vitais: PA (pressão arterial) = 90x40 mmHg, FR (frequência respiratória) = 30 irpm e FC (frequência cardíaca) = 122 bpm. 
J.F.N.R. foi encaminhada para consulta no PA com o médico plantonista. Ao exame clínico do plantonista a paciente apresentou os seguintes sintomas: Dor lombar no flanco esquerdo, Taquidispnéia (aumento do número do número de incursões respiratórias), hipotensão, mal estar geral e tontura. A paciente nega náuseas, vômitos e diarreia. Ao exame físico a mesma apresenta-se lúcida, orientada, hipocorada, anictérica (ausência de icterícia) e afebril. A paciente afirma ter mantido relação sexual com o namorado sem preservativo e a mesma relatou que está apresentando o ciclo menstrual irregular.
Com base nestes sintomas o clínico solicitou os seguintes exames: Hemograma, PCR (proteína C reativa), Sódio, Potássio, Gasometria, Ureia, Creatinina, Urina rotina (EAS), Urocultura e Hemocultura, ECG (ecocardiograma) e Beta HCG.
Os resultados dos exames foram os seguintes:

HEMOGRAMA
ERITROGRAMA
ANALITO
RESULTADO
VALOR DE REFERÊNCIA
HEMÁCIAS
3,64x106/mm3
3,7-5,3x106/mm3
HEMOGLOBINA
9,7 g/dL
11,7-15,7 g/dL
HEMATÓCRITO
28,4%
35-47%
HCM
26,6 pg
26-34 pg
VCM
78,0 µ3
80-100 µ3
CHCM
34,2%
30-38%
RDW
13,0%
11,6-14,8%
LEUCOGRAMA
LEUCÓCITOS
590/mm3
4.000-11.000/mm3
BLASTOS
*
0%
PRÓMIELÓCITOS
*
0%
METAMIELÓCITOS
*
0%
BASTONETES
*
0-1%
SEGMENTADOS
*
50-65%
EOSINÓFILOS
*
0-5%
BASÓFILOS
*
0-1%
LINFÓCITOS
*
20-45%
MONÓCITOS
*
1-10%
LINFÓCITOS ATÍPICOS
*
0%
CONTAGEM DE PLAQUETAS
PLAQUETAS
114.000/mm3
150.000-450.000/mm3
HEMATOSCOPIA

Discreta microcitose
A contagem diferencial de leucócitos não foi realizada pois a contagem global encontra-se abaixo de 1.000 células/mm3.
IONOGRAMA
ANALITO
VALOR ENCONTRADO
VALOR DE REFERÊNCIA
SÓDIO (NA)
136,0 mEq/L
135-145 mEq/L
POTÁSSIO (K)
2,60 mEq/L
3,3-5,0 mEq/L
GASOMETRIA
ANALITO
VALOR ENCONTRADO
VALOR DE REFERÊNCIA
pH
7,446
7,35-7,45
pO2
74,0 mmHg
83-108 mmHg
pCO2
19,6 mmHg
35-45 mmHg
cHCO3
13,2 mmol/L
21-28 mmol/L
BE
-8,1 mmol/L
-3,0 a +3,0 mmol/L
SO2(c)
95,0%
95-99,0%

FUNÇÃO RENAL
ANALITO
VALOR ENCONTRADO
VALOR DE REFERÊNCIA
UREIA
46,0 mg/dL
15-45 mg/dL
CREATININA
1,5 mg/dL
0,5-1,2 mg/dL
BETA HCG
ANALITO
VALOR ENCONTRADO
VALOR DE REFERÊNCIA
BETA HCG
NÃO REATIVO
NÃO REATIVO

ROTINA DE URINA
EXAME FÍSICO/QUÍMICO
ANALITO
VALOR ENCONTRADO
VALOR DE REFERÊNCIA
COR
AMARELO
AMARELO
ASPECTO
TURVO
LÍMPIDO
ODOR
FÉTIDA
SUI GENERIS
pH
6,0
< 7,0
PROTEÍNAS
(++)
AUSENTE
GLICOSE
AUSENTE
AUSENTE
ACETONA
AUSENTE
AUSENTE
BILIRRUBINA
AUSENTE
AUSENTE
HEMOGLOBINA
(+++)
AUSENTE
NITRITOS
POSITIVO
NEGATIVO
SEDIMENTOSCOPIA
CÉLULAS
RARAS
AUSENTES-RARAS P/C
LEUCÓCITOS
CAMPOS REPLETOS
0-10 P/C
HEMÁCIAS
CAMPOS REPLETOS
0-3 P/C
CILINDROS
HEMÁTICOS (++)
LECOCITÁRIOS (++)
AUSENTES
CRISTAIS
OXALATO DE CÁLCIO (++)
AUSENTES
BACTÉRIAS
(++++)
(+)
MUCO
(++)
(+)
PRESENÇA DE HISTIÓCITOS
PRESENÇA DE PIÚRIA MACIÇA.
O exame de ECG (ecocardiograma) revelou a presença de taquicardia sinusal com frequência cardíaca de 122 bpm por minuto. 
As amostras de hemocultura foram coletadas com a devida assepsia da pele com álcool 70%, sendo as mesmas inoculadas em frascos de hemocultura manual e a amostra de urina foi encaminhada para a realização de urocultura.
Com base nos resultados dos exames acima, o médico descarta provável gravidez ectópica e sugere que o provável diagnóstico da paciente seja o de sepse de foco urinário associado com o quadro de choque endotóxico. 
Após a coleta das amostras de hemocultura (3 amostras coletadas em sítios anatômicos diferentes), foi administrado uma dose elevada de Rocefin (Ceftriaxona) como tratamento inicial de escolha para a paciente. Depois de 24 horas de internação J.F.N.R. evolui com o quadro de insuficiência respiratória, sendo necessário a intubação da paciente (ventilação mecânica) para a correção do quadro de insuficiência respiratória, sendo a mesma transferida para a UTI (Unidade de Terapia Intensiva da Instituição).
O Microbiologista de plantão recebeu a amostra de urina da paciente e realizou o Gram de gota para melhor avaliação da qualidade da mesma. O Gram de gota revelou a presença de numerosos leucócitos polimorfonucleares e a presença de numerosos bastonetes Gram-negativos com coloração bipolar (ou seja o centro do bastonete é menos corado que a periferia). Abaixo  serão demonstradas fotografias do sedimento e do Gram de gota de J.F.N.R.
Imagem 1: Sedimento de urina de J.F.N.R. Note a
presença de incontáveis leucócitos, presença
de numerosas bactérias e a presença no
centro da imagem de um cristal de oxalato de cálcio.
Fonte: Acervo do pesquisador.
























Imagem 2: Sedimento de urina de J.F.N.R. Note a
presença de um Histiócito no centro da imagem.
Fonte: Acervo do pesquisador.

Imagem 3: Gram de gota de J.F.N.R. Note a
presença de numerosos leucócitos na imagem.
Fonte: Acervo do pesquisador.

Imagem 4: Gram de gota de J.F.N.R.
Note a presença de bastonetes Gram-negativos
e hemácias.
Fonte: Acervo do pesquisador.
























Após a realização do Gram de gota, a amostra de urina foi semeada em ágar Cled e foi incubada em estufa a 35oC por 24 horas em ar ambiente. Os frascos de hemocultura foram incubadas na mesma condição da urina. Após 24 horas de incubação a placa de ágar Cled foi analisada e o Microbiologista observou o crescimento de numerosas colônias (contagem de colônias > 100.000 UFC/mL) fermentadoras de lactose com morfologia compatível com um bastonete Gram-negativo pertencente a família Enterobacteriaceae. A imagem da placa de ágar Cled é demonstrada abaixo:
Imagem 5: Crescimento de Enterobacteriaceae em ágar Cled.
Note a presença de colônias lactose positiva (amarelas).
Fonte: Acervo do pesquisador.





















Os frascos de hemocultura foram analisados após 24 horas de incubação e observou-se uma intensa turvação do meio de cultura e presença de gás, evidenciando que os frascos foram positivos, indicando o crescimento de algum microrganismo presente no sangue da paciente. O caldo de hemocultura foi aspirado com o auxílio de uma agulha e seringa estéreis, sendo que antes da aspiração a tampa do frasco foi higienizada com álcool a 70%, sendo o mesmo foi transferido para um tubo de vidro estéril para a realização de exame a fresco, coloração de Gram e semeadura em meios apropriados. A coloração de Gram revelou a presença de numerosos bastonetes Gram-negativos com coloração bipolar (ou seja o centro do bastonete é menos corado que a periferia do mesmo), sugerindo que o microrganismo em questão seja pertencente à família Enterobacteriaceae. Com a informação da coloração de Gram em mãos, o Microbiologista realizou o repique do caldo de hemocultura em ágar EMB modificado por Levine (sem a adição de sacarose ao meio), sendo que a placa foi incubada em estufa a 35oC por 24 horas em ar ambiente.  Abaixo é demonstrado as imagens do frasco de hemocultura positivo, o exame a fresco do caldo e o resultado de Gram do caldo.
Imagem 6: Frasco de hemocultura positivo.
Note a turvação do caldo BHI.
Fonte: Acervo do pesquisador.






















Imagem 7: Exame a fresco do caldo de
hemocultura. Note a presença de hemácias e
bactérias em forma de bastão.
Fonte: Acervo do pesquisador.
























Imagem 7: Gram do caldo de hemocultura.
Note a presença de numerosos bastonetes Gram-negativos
com coloração "bipolar" sugestivos de Enterobacteriaceae.
Fonte: Acervo do pesquisador.























O Microrganismo isolado da urocultura foi identificado com o auxílio do meio de Rugai modificado por Pessoa e Silva, apresentando as seguintes características bioquímicas: Fermentação da lactose (+), Fermentação da glicose com produção de gás (+), Fermentação da sacarose (+), Descarboxilação da lisina (+), Motilidade (+), hidrólise da ureia (-), produção de H2S (-), Presença da enzima fenilalanina desaminase (-), produção de indol (+). Com base nestas características o microrganismo em questão foi identificado como sendo uma Escherichia coli. O teste de sensibilidade aos antimicrobianos foi realizado pela técnica de Kirby-Bauer (disco-difusão) com base nas normatizações do CLSI e EUCAST. Foram testados os seguintes antimicrobianos para a urocultura: Amoxicilina, Amoxicilina + Ácido Clavulânico, Ampicilina + Sulbactam, Piperacilina + Tazobactam, Cefazolina, Ceftriaxona, Ceftazidima, Cefepime, Meropenem, Gentamicina, Amicacina, Norfloxacino, Ciprofloxacino, Levofloxacino, Sulfametoxazol + Trimetoprim, Tetraciclina e Polimixina B.
Após 24 horas de incubação a placa de agar EMB inoculada com o caldo da hemocultura foi analisada e observou-se o crescimento de colônias pretas com pigmento verde metálico, indicando que o microrganismo é capaz de fermentar avidamente (fortemente) a lactose. Esta característica no meio de agar EMB sugere que a identificação do microrganismo seja uma Escherichia coli. Abaixo está demonstrada uma imagem da placa de ágar EMB.
Imagem 8: Crescimento de bastonete Gram-negativo
na hemocultura. Note a presença de pigemento
verde metálico. Esta característica indica que
o microrganismo produz muito ácido através
da fermentação da lactose, sugerindo a identificação
de Escherichia coli.
Fonte: Acervo do pesquisador.

























Imagem 9: Colônias isolada em ágar EMB.
fonte: Acervo do pesquisador.





















O Microrganismo isolado da Hemocultura foi identificado com o auxílio do meio de Rugai modificado por Pessoa e Silva, apresentando as seguintes características bioquímicas: Fermentação da lactose (+), Fermentação da glicose com produção de gás (+), Fermentação da sacarose (+), Descarboxilação da lisina (+), Motilidade (+), hidrólise da ureia (-), produção de H2S (-), Presença da enzima fenilalanina desaminase (-), produção de indol (+). Com base nestas características o microrganismo em questão foi identificado como sendo uma Escherichia coli. O teste de sensibilidade aos antimicrobianos foi realizado pela técnica de Kirby-Bauer (disco-difusão) com base nas normatizações do CLSI e EUCAST. Foram testados os seguintes antimicrobianos para a urocultura: Amoxicilina, Amoxicilina + Ácido Clavulânico, Ampicilina + Sulbactam, Piperacilina + Tazobactam, Cefazolina, Ceftriaxona, Ceftazidima, Cefepime, Meropenem, Gentamicina, Amicacina, Ciprofloxacino, Levofloxacino, Sulfametoxazol + Trimetoprim, Tetraciclina, Polimixina B e Cloranfenicol.
Após 24 horas de incubação o antibiograma da urocultura foi analisado e o resultado está demonstrado abaixo:
RESULTADO DE UROCULTURA
Germe isolado: Escherichia coli
Mecanismos de resistência encontrados fenotipicamente: Produção de betalactamase fenótipo blaTEM-1 + alteração de rota metabólica do PABA (genes plasmidiais)
ANTIMICROBIANO
MEDIDA DO HALO
(mm)
SENSÍVEL
(mm)
INTERMEDIÁRIO
(mm)
RESISTENTE
(mm)
INTERPRETAÇÃO
AMOXICILINA
0
> 14
-
< 13
RESISTENTE
AMOXICILINA +
ÁCIDO CLAVULÂNICO
20
> 16
-
< 15
SENSÍVEL
AMPICILINA +
SULBACTAM
16
> 14
-
< 13
SENSÍVEL
PIPERACILINA +
TAZOBACTAM
33
> 21
18-20
< 17
SENSÍVEL
CEFAZOLINA
27
> 23
20-22
< 19
SENSÍVEL
CEFTRIAXONA
34
> 25
22-24
< 21
SENSÍVEL
CEFTAZIDIMA
32
> 21
18-20
< 17
SENSÍVEL
CEFEPIME
36
> 27
21-26
< 20
SENSÍVEL
MEROPENEM
33
> 22
16-21
< 15
SENSÍVEL
GENTAMICINA
21
> 17
14-16
< 13
SENSÍVEL
AMICACINA
21
> 18
15-17
< 14
SENSÍVEL
NORFLOXACINO
32
> 17
14-16
< 13
SENSÍVEL
CIPROFLOXACINO
34
> 26
24-25
< 23
SENSÍVEL
LEVOFLOXACINO
33
> 23
19-22
< 18
SENSÍVEL
SULFAMETOXAZOL +
TRIMETOPRIM
0
> 14
11-13
< 10
RESISTENTE
TETRACICLINA
20
> 15
12-14
< 11
SENSÍVEL
POLIMIXINA B
16
> 14
-
-
SENSÍVEL
Após 24 horas de incubação o antibiograma da hemocultura foi analisado e o resultado está demonstrado abaixo:
RESULTADO DE HEMOCULTURA
Germe isolado: Escherichia coli
Mecanismos de resistência encontrados fenotipicamente: Produção de betalactamase fenótipo blaTEM-1 + alteração de rota metabólica do PABA (genes plasmidiais)
ANTIMICROBIANO
MEDIDA DO HALO
(mm)
SENSÍVEL
(mm)
INTERMEDIÁRIO
(mm)
RESISTENTE
(mm)
INTERPRETAÇÃO
AMOXICILINA
0
> 14
-
< 13
RESISTENTE
AMOXICILINA +
ÁCIDO CLAVULÂNICO
20
> 16
-
< 15
SENSÍVEL
AMPICILINA +
SULBACTAM
16
> 14
-
< 13
SENSÍVEL
PIPERACILINA +
TAZOBACTAM
33
> 21
18-20
< 17
SENSÍVEL
CEFAZOLINA
27
> 23
20-22
< 19
SENSÍVEL
CEFTRIAXONA
34
> 25
22-24
< 21
SENSÍVEL
CEFTAZIDIMA
32
> 21
18-20
< 17
SENSÍVEL
CEFEPIME
36
> 27
21-26
< 20
SENSÍVEL
MEROPENEM
33
> 22
16-21
< 15
SENSÍVEL
GENTAMICINA
21
> 17
14-16
< 13
SENSÍVEL
AMICACINA
21
> 18
15-17
< 14
SENSÍVEL
CLORANFENICOL
28
> 17
-
< 16
SENSÍVEL
CIPROFLOXACINO
34
> 26
24-25
< 23
SENSÍVEL
LEVOFLOXACINO
33
> 23
19-22
< 18
SENSÍVEL
SULFAMETOXAZOL +
TRIMETOPRIM
0
> 14
11-13
< 10
RESISTENTE
TETRACICLINA
20
> 15
12-14
< 11
SENSÍVEL
POLIMIXINA B
16
> 14
-
-
SENSÍVEL
Abaixo é demonstrado a imagem do antibiograma da hemocultura:
Imagem 10: Teste de sensibilidade aos antimicrobianos
em uma cepa de Escherichia coli.
Fonte: Acervo do pesquisador.






















Imagem 11: Teste de sensibilidade aos antimicrobianos
em uma cepa de Escherichia coli.
Fonte: Acervo do pesquisador.

Com base nas características do microrganismo e na clínica da paciente, foi possível afirma que o diagnóstico clínico-laboratorial da paciente foi sepse de foco urinário causada por Escherichia coli.
Após 48 horas na UTI, J.F.N.R. apresentou melhora clínica importante, sendo realizado neste período o desmame da ventilação mecânica e alta da paciente da UTI. 
7 dias após a internação, a paciente ganhou alta hospitalar com uma receita de Ciprofloxacino por via oral e orientação para retorno ao consultório médico após o fim do tratamento para fins de controle.

DISCUSSÃO

1) Descreva a fisiopatologia da sepse.

R: A fisiopatologia da sepse está intimamente ligada à interação das células do hospedeiro com os componentes bacterianos presentes na corrente sanguínea, como lipopolissacarídeo (LPS) das bactérias Gram-negativas. Essa endotoxina, o LPS, contém uma porção tóxica denominada lipídeo A, comum a todos os Gram-negativos. Entre as células do hospedeiro que reagem aos componentes bacterianos, destacam-se os macrófagos e as células endoteliais. A ativação dos macrófagos decorre da ligação do LPS com o receptor CD14; já as células endoteliais necessitam, para sua ativação pelo LPS, da formação prévia do complexo formado entre este e a forma solúvel de CD14. Os macrófagos ativados produzem, entre outros, o fator de necrose tumoral-alfa (TNF-alfa) e a interleucina-1 - importantes mediadores da sepse. A administração de TNF-alfa decombinante em animais reproduz o quadro clínico da sepse, e a administração de anticorpos anti-TNF-alfa protege os animais do efeito letal do LPS. As células endoteliais são importantes alvos das citocinas inflamatórias da sepse e, ao mesmo tempo, importante fonte de mediadores. As alterações no endotélio são responsáveis pela maioria dos fenômenos observados na sepse, como a síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA), coagulação intravascular disseminada (CIVD), insuficiência renal aguda (IRA) e estado hiperdinâmico seguido de falência miocárdica.
Abaixo está demonstrada uma ilustração da fisiopatologia da sepse:
Imagem 12: Fisiopatologia da sepse.
fonte: http://www.medicinanet.com.br/conteudos/acp-medicine/5797/sepse.htm




2) Quais fatores de virulência permitiram a Escherichia coli causar a sepse?

R: Vários dos fatores de virulência epidemiologicamente associados à Escherichia coli isolada da corrente sanguínea sãos os mesmos envolvidos com a patogenicidade em outros sítios anatômicos, como: Sistemas de captação de ferro tipo aerobactina e as adesinas tipo 1 e P e o LPS.

3) Quais são as características bioquímicas deste microrganismo?

Fermentação da lactose (+) --> Este microrganismo é capaz de fermentar a molécula de lactose através da ação de duas enzimas específicas em seu metabolismo. A primeira enzima que atua é denominada Betagalactosídeo permease (que atua na captação da molécula de lactose do meio extracelular para o meio intracelular através da membrana celular bacteriana, pois a maioria dos carboidratos como a lactose, não é capaz de atravessar a bicamada lípica sem uma proteína carreadora), e a segunda enzima que atua no metalobismo da lactose é a denominada Betagalactosidase (que é capaz de clivar a molécula de lactose em glicose e galactose que servirão como fonte de energia e carbono para o microrganismo).

Fermentação da glicose (+) --> Este microrganismo é capaz de fermentar a molécula de glicose e produzir ácido e gás. A molécula de glicose é convertida em piruvato (um composto de três carbonos altamente energético) através da via de Embden Meyerhof (rota mais comum da glicólise nos microrganismos fermentadores). O piruvato é convertido em energia através da via dos ácidos mistos (com a produção de grande quantidade de ácidos mistos: Ácido Acético, Ácido Lático e Ácido Fórmico e pequena produção de gás). Do ponto de vista prático, este microrganismo é capaz de positivar o teste de Vermelho de Metila (indica a produção de grande quantidade de ácidos mistos) e é negativo para o teste de Voges Proskauer.

Fermentação da Sacarose (+) → Este microrganismo é capaz de fermentar a sacarose através da ação da enzima sucrase quebrando-a em Glicose e Frutose.

Motilidade (+) --> 
Este microrganismo apresenta a expressão fenotípica do antígeno H (antígeno flagelar), sendo móvel por flagelo peritríquio (flagelo distribuído por todo o microrganismo)

Lisina (+) --> Este microrganismo é capaz de descarboxilar a Lisina em Cadaverina através da ação da enzima Lisina Descarboxilase (LDC).

Hidrólise da uréia (-)

Produção de H2S (-)

Fenilalanina desaminase (-)

Produção de indol (+) --> 
Este microrganismo é capaz de metabolizar o molécula de Triptofano através da ação da enzima Triptofanase em indol.


4) Quais mecanismos de resistência encontrados nesta cepa de Escherichia coli?

R: BETALACTÂMICOS:  Cepa produtora de Betalactamase fenótipo blaTEM-1. A presente enzima pertence a classe molecular A da classificação de Ambler, sendo que sua atividade hidrolítica é inibida por Ácido Clavulânico. A produção de TEM-1 leva a hidrólise em grande escala das Aminopenicilinas lábeis (Ampicilina e Amoxicilina) e em menor escala e conferindo baixo nível de resistência (as vezes nem demonstrado no antibiograma) das Cefalosporinas de primeira geração (Cefazolina, Cefalotina, Cefalexina e Cefadroxil).
Note abaixo a ação da enzima TEM-1 no antibiograma:
Imagem 13: Ação da enzima TEM-1. Note a resistência a
Amoxicilina e a sensibilidade a Amoxicilina + Ácido Clavulânico.
Fonte: Acervo do pesquisador.















INIBIDORES DA SÍNTESE DO ÁCIDO FÓLICO: Cepa com alteração de rota metabólica do PABA. Portanto a presente cepa não responde ao tratamento com Sulfametoxazol + Trimetoprim.
Imagem 14: Cepa com alteração de rota metabólica do PABA.
Note a resistência ao Sulfametoxazol + Trimetoprim.
Fonte: Acervo do pesquisador.






















4) A paciente J.F.N.R poderia ser tratada com segurança com a Cefazolina?

R: Não. Apesar da Escherichia coli ser sensível a Cefazolina (Cefalosporina de primeira geração), ficou demonstrado pelo antibiograma que esta cepa é produtora de Betalactamase TEM-1. Portanto a hiperprodução de TEM-1 levaria a hidrólise da Cefazolina e consequentemente a falha terapêutica durante o tratamento.

5) Referências:


  1. ANVISA. Corrente Sanguínea: Critérios Nacionais de Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde. 2009. Disponível em: http://www.anvisa.gov.br/servicosaude/manuais/correntesanguinea.pdf.
  2. SALOMÃO, R.; PIGNATARIA, A.C.C. Infectologia. Barueri: Manole, 2006, 580p.
  3. TRABULSI, L.R., ALTHERTHUM, F. Microbiologia. Sexta edição. São Paulo: Atheneu, 2015, 888p.

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