sábado, 28 de outubro de 2017

Klebsiella pneumoniae produtora de ESBL

INTRODUÇÃO


As betalactamases de espectro estendido (ESBL) são enzimas que pertencem em sua grande maioria à classe molecular A da classificação de Ambler (ou seja são serinobetalactamases (possuem serina em seu sítio ativo) e são inibidas por inibidores de betalactamase (Ácido Clavulânico, Sulbactam e Tazobactam) e são capazes de hidrolisar a maioria das penicilinas e cefalosporinas, incluindo compostos oxiiminobetalactâmicos (Cefuroxima, Cefalosporinas de terceira e quarta gerações) e Monobactâmicos (Aztreonam), mas não hidrolisam as cefamicinas ou carbapenêmicos. O perfil de hidrólise das ESBLs é demonstrado na tabela 1:

Tabela 1: Perfil de hidrólise das ESBLs:

Penicilinas lábeis
Penicilinas associadas a inibidores de
β-lactamase
Cefalosporinas de
1ª geração
Cefalosporinas de
2ª geração
Cefalosporinas de 3ª geração
Cefalosporinas de 4ª geração
Monobactâmicos
Carbapenêmicos
SIM
NÃO
SIM
SIM* **
SIM
SIM
SIM
NÃO**
*AS CEFAMICINAS (CEFOXITINA) NÃO É HIDROLISADA PELA ESBL.
**PODE OCORRER RESISTÊNCIA ÀS CEFAMICINAS E AOS CARBAPENÊMICOS ATRAVÉS DA ASSOCIAÇÃO DE HIPERPRODUÇÃO DE ESBL + PERDA E/OU MUTAÇÃO DE CANAIS PORINA (ompF em Escherichia coli e ompK35 em Klebsiella pneumoniae).

Figura 1: Hidrólise do anel Betalactâmico pela ESBL.
Fonte: SILVA, K.C.; LINCOPAN, N.; 2012.













As primeiras cepas produtoras de ESBL foram identificadas em 1983, e desde então têm sido reportadas em todo o mundo. Essa distribuição é um resultado da expansão clonal de organismos produtores de ESBL, da transferência horizontal de genes de ESBL em plasmídeos e, menos comumente, surgimento de novas enzimas. Certamente os grupos clinicamente mais importantes de ESBLs são as enzimas CTX-M, seguido de SHV e ESBLs derivados de TEM. Certas enzimas derivadas de OXA da classe D também estão incluídas dentro do grupo das ESBLs, embora a inibição por inibidores de betalactamase de classe A seja mais fraca do que para outras ESBLs.
A produção de ESBL tem sido observada principalmente em Enterobacteriaceae, inicialmente em ambientes hospitalares, mais tarde, em casas de repouso, e desde o ano 2000, na comunidade (pacientes ambulatoriais, portadores saudáveis, animais doentes e saudáveis, produtos alimentícios). As espécies produtores de ESBL mais frequentemente encontradas são Escherichia coli e Klebsiella pneumoniae. No entanto, todas as outras espécies de Enterobacteriaceae clinicamente relevantes são também comumente produtoras de ESBL.
A grande maioria das ESBLs é constituída de enzimas adquiridas, codificadas por genes localizados em plasmídeos. As ESBLs adquiridas são expressas em vários níveis, e diferem significamente quanto às suas características bioquímicas, tais como atividade contra Betalactâmicos específicos (por exemplo: Cefotaxima, Ceftazidima, Aztreonam). O nível de expressão e as propriedades de uma enzima, e a presença simultânea de outros mecanismos de resistência (outras Betalactamases, efluxo, permeabilidade alterada) resultam em uma grande diversidade de fenótipos de resistência observados entre os isolados ESBL-positivos.

DETECÇÃO DE ESBL EM Klebsiella pneumoniae

  1. Local de isolamento do microrganismo: Urina.
  2. Doenças de base do paciente: Insuficiência renal crônica.
  3. Metodologia empregada: Disco aproximação.

Imagem 2: Teste de sensibilidade aos antimicrobianos em uma
cepa de Klebsiella pneumoniae isolada de urocultura.
Fonte: Acervo do autor.


















Imagem 3: Detalhe do teste de disco aproximação. Note a presença
de "halos fantasmas" entre os discos de cefalosporinas de terceira e
quarta gerações e o disco de Amoxicilina + Ácido Clavulânico (AMC).
Isto indica que a presença deste inibidor de betalactamase reconstitui a
ação das cefalosporinas afetadas pela enzima produzida pelo microrganismo.
Este teste é considerado positivo para produção de ESBL.
Fonte: Acervo do autor.

















Imagem 4: Note a sensibilidade a Cefoxitina (CFO). A ESBL
não hidrolisa este antimicrobiano.
Fonte: Acervo do autor.


















Imagem 5: Note a presença de mutação na porção gyrA da enzima DNA-girase. Esta mutação leva a resistência aos
antimicrobianos da classe das Fluoroquinolonas (neste caso demonstradas
pelo Ciprofloxacino (CIP) e Levofloxacino (LVX)). Como este microrganismo
expressa ESBL, normalmente também é encontrado o gene qnr plasmidial
que confere baixo nível de resistência às Fluoroquinolonas.
Fonte: Acervo do autor.




















Imagem 6: Note a alteração de rota metabólica do PABA que este
microrganismo expressa através da resistência ao Sulfametoxazol +
Trimetoprim.
Fonte: Acervo do autor.





















CONCLUSÃO


Através deste antibiograma podemos notar que a maioria dos microrganismo que expressam ESBL são considerados mutirresistentes, pois expressam resistência não somente aos Betalactâmicos, mas também expressam resistência a outras classes de antimicrobianos como as Fluroquinolonas e os inibidores de síntese do ácido fólico. Este expressão de multirresistência se deve ao fato do gene que expressa ESBL, estar presente em um plasmídeo grande que contém genes de resistência a outros antimicrobianos, como o gene qnr (que expressa uma proteína capaz de proteger a enzima DNA-girase da ação das Fluoroquinolonas), enzimas modificadoras de aminoglicosídeos (ex: AAC(3')) e enzimas que induzem a alteração de rota metabólica do PABA.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  1. SILVA, Ketrin Cristina da  and  LINCOPAN, Nilton. Epidemiologia das betalactamases de espectro estendido no Brasil: impacto clínico e implicações para o agronegócio. J. Bras. Patol. Med. Lab. 2012, vol.48, n.2, pp.91-99.



terça-feira, 3 de outubro de 2017

DETECÇÃO FENOTÍPICA DOS PRINCIPAIS MECANISMOS DE RESISTÊNCIA AS LINCOSAMIDAS

METILAÇÃO NA PORÇÃO 23S DO rRNA (GENE erm)

DEFINIÇÃO

O gene erm induz a modificação do ribossomo bacteriano (metilação na porção 23S do rRNA), tornando desta forma o microrganismo resistente aos Macrolídeos e Lincosamidas.

CLASSIFICAÇÃO

Modificação no sítio alvo de ação do antimicrobiano.

ANTIMICROBIANOS AFETADOS

Eritromicina;
Claritromicina;
Azitromicina;
Lincomicina;
Clindamicina.

FORMAS DE DISSEMINAÇÃO

Plasmideais;
Cromossômicas (SCCmec --> transposição).

ANTIMICROBIANOS UTILIZADOS NA DETECÇÃO

Eritromicina;
Clindamicina.

COMO DETECTAR FENOTIPICAMENTE

Através do D-Teste.

D-TESTE
  • Preparar uma suspensão da cultura pura do microrganismo a ser testado (ex: Staphylococcus aureus) equivalente a escala 0,5 MacFarland e semear em uma placa de Ágar Mueller Hinton;
  • Colocar o disco de Eritromicina e 20 mm centro a centro deste, o disco de Clindamicina;
  • Incubar por 18-24 horas e realizar a leitura do halo de inibição;
  • Positivo: De acordo com a tabela 1;
  • Negativo: De acordo com a tabela 1.

TABELA 1: Critérios de interpretação do D-teste

MECANISMO
GENE
ENZIMA
ERI
CLI
TESTE DE INDUÇÃO
COMO REPORTAR
ALTERAÇÃO RIBOSSÔMICA
erm
MLSi
R
S
+
ERI – R
CLI – R
erm
MLSC
R
R
-
ERI – R
CLI – R
EFLUXO
msrA
-
R
S
-
ERI – R
CLI – S
ERI = Eritromicina; CLI = Clindamicina

EXEMPLO DE DETECÇÃO

Imagem 1: Detecção fenotípica do gene msrA (bomba de efluxo).
Note a resistência a Eritromicina e a sensibilidade a Clindamicina,
sem achatamento do halo de inibição da Clindamicina. Esta cepa
é portanto sensível a Clindamicina e resistente a Eritromicina.
Microrganismo: Staphylococcus aureus


















Imagem 2: Detecção fenotípica do gene erm (metilação
na porção 23S do rRNA). Note a resistência a Eritromicina
e sensibilidade a Clindamicina, com achatamento do halo de
inibição da Clindamicina (fenótipo MLSi). Esta cepa é portanto
resistente a Eritromicina e a Clindamicina.
Microrganismo: Staphylococcus aureus


















Imagem 3: Detecção fenotípica do gene erm (metilação
na porção 23S do rRNA). Note a resistência a Eritromicina
e resistência a Clindamicina, (fenótipo MLSc). Esta cepa é portanto 
resistente a Eritromicina e a Clindamicina.
Microrganismo: Staphylococcus epidermidis















LINCOSAMIDAS

INTRODUÇÃO

As Lincosamidas ou lincomicinas são antibióticos heterosídeos originais, mas com espectro e mecanismo de ação que se aproximam dos macrolídeos, com quem, inclusive, podem ter resistência cruzada. Esta classe é formada por um antibiótico natural, a Lincomicina e, por cinco derivados semissintéticos, dos quais somente a Clindamicina é utilizada na clínica, por apresentar melhor atividade antimicrobiana. Tem efeito bacteriostático e seu mecanismo de ação é o de bloquear a síntese proteica, de maneira similar aos antibióticos Macrolídeos.

Imagem 1: Molécula de Lincomicina (Lincosamida natural). Note
a presença do anel heterosídeo nesta molécula (contendo nitrogênio)

















Imagem 2: Molécula de Clindamicina. Note a presença do anel
heterosídeo semelhante a molécula de lincosamida, mas com alteração
na cadeia lateral, que confere melhor absorção do fármaco e melhor
espectro de ação.



















MECANISMO DE AÇÃO

Apresentam ação bacteriostática por bloquearem a síntese proteica bacteriana. As drogas se ligam à subunidade 50S do ribossomo bacteriano e impedem a transferência dos aminoácidos conduzidos pelo RNA de transporte para a cadeia polipeptídica em formação.

Imagem 3: Mecanismo de ação das lincosamidas. Estes fármacos
se ligam de maneira reversível (ou seja a ação de inibição da síntese
proteica pode ser revertida com a retirada da droga) na porção 50S
do ribossomo bacteriano (especificamente na porção 23S do rRNA
bacteriano) e inibem a síntese de proteínas essenciais para o desenvolvimento
do microrganismo.




















PRINCIPAIS REPRESENTANTES

  • Lincomicina;
  • Clindamicina (utilizado na clínica).

PRINCIPAIS MECANISMOS DE RESISTÊNCIA

  • Metilação na porção 23S do rRNA (gene erm).

Imagem 4: Exemplo de detecção do gene erm em Staphylococcus
aureus.
 Note na imagem superior que ocorre achatamento do halo
da Clindamicina (expressão do gene erm). Na imagem inferior
não ocorre o achatamento do halo de Clindamicina (ausência do
gene erm). 
























Na próxima postagem será demonstrada como é realizado a detecção laboratorial do gene erm.